Problemas odontológicos: eles podem interferir no adestramento básico

Atualmente, muitos proprietários e treinadores estão conhecendo e comprovando os efeitos benéficos da manutenção e correção dentaria nos equinos. Os exames e tratamentos odontológicos realizados nos equinos são de extrema importância e refletem diretamente na saúde, desenvolvimento e desempenho dos animais nos concursos de marchas.

Porém, os cuidados com os dentes dos cavalos é uma questão de respeito, dedicação, carinho e amor pelo animal. Muitas vezes o excesso ou a falta de apoio na embocadura, os puxões nas rédeas, a rebeldia, a relutância durante a montaria, são sintomas de algumas anormalidades na cavidade oral dos equinos. Outros sintomas como a lentidão na mastigação dos alimentos, a ração derramada fora do cocho, o emagrecimento progressivo e a dificuldade de engorda também são as formas dos cavalos reclamarem seu incomodo com os dentes.

A raça Mangalarga Marchador nos últimos anos tem crescido gradativamente e hoje é a maior raça de equinos da América Latina. As exigências que se iniciam desde os estudos genéticos, os cruzamentos e mão de obra capacitada vêm aumentando cada vez mais, e o fator resultante de tudo isso é a qualidade dos animais que disputam campeonatos de Marcha e exposições de altíssimo nível.

Diante do crescimento da Equideocultura nacional, a Odontologia equina vem demonstrando que os animais que são predispostos a patologias odontológicas no período pré-doma, têm como consequência uma pior resposta e aceitação aos comandos de rédeas e exercícios aplicados no adestramento básico. Estes animais depois de tratados apresentam maior conforto na embocadura e com isso aumentam o poder de desconcentração do maxilar, atendendo melhor aos comandos do cavaleiro e encontrando o apoio ideal, fazendo com que diminuam as dificuldades e os problemas encontrados durante todo o processo de adestramento e confirmação.

Principais problemas odontológicos

Pontas de esmalte dentário: A ponta dentaria se caracteriza pelo crescimento de estruturas pontudas nos dentes dos animais. Por serem alongamentos do esmalte que protege os dentes, essas pontas também podem ser formadas por cemento e dentina. A ponta dentária cresce nas bordas laterais dos pré-molares e molares mandibulares, podendo causar laceração das bochechas e da língua durante a mastigação. Com isso, os tecidos moles são machucados e os dentes deslocados, causando a doença periodontal, que resulta na perda de comida em pequenas quantidades durante a mastigação. A essa perda damos o nome de Disfagia.

Extração do primeiro pré-molar ou dente de lobo: Na fase de mastigação, o dente de lobo não é prejudicial por ser um dente vestigial, mas ao se colocar a embocadura e iniciar a doma com esse pequeno dente, o animal poderá sofrer impactos causando dor intensa devido à região ser extremamente inervada deixando o animal reativo à doma e ao treinamento. Esses dentes devem ser extraídos apenas por um profissional devidamente qualificado.

Retenção de capas dentárias: Na retenção da capa pode haver restos dos pré-molares decíduos. Essas capas podem ocorrer nos equinos entre dois e quatro anos e meio de idade, idade esta em que geralmente os dentes deveriam cair e nascer os permanentes. Os dentes deciduais causam desconforto na hora da alimentação e devem ser extraídos quando não há troca natural pelos permanentes.

Assimetrias das conclusões dentárias: São problemas onde estes animais estão propensos ao aparecimento de ganchos, rampas e ondas dentárias, que são frequentes causadores de ferimentos dentro da boca do animal, alterando a biomecânica e a dinâmica dos movimentos mastigatórios.

Restaurações e correções dentárias: As correções devem ser iniciadas no período “pré-doma”. ou seja, antes de apresentar a embocadura ao animal, fazendo com que assim possamos eliminar traumas adquiridos devido aos problemas odontológicos e melhorar a aceitação da embocadura. O animal que permanece muito tempo na baia normalmente tem a mastigação alterada. O animal que fica por mais tempo preso ingere o alimento com maior velocidade e tem menos excursão lateral no momento de mastigação; assim ele tem mais movimentos, que acaba coincidindo com maior incidência de pontas dentarias principalmente na região das bochechas (vestibular).

Doma e Adestramento

Sabendo que a saúde dos equinos se inicia pela boca, a equitação também não foge de tal conceito. Qualquer incomodo pode ser resultado de assimetrias, má postura, dores e algumas enfermidades que venham refletir diretamente na vida, no desempenho e na qualidade de movimentação dos equinos de marcha.

Adestramento Básico

Veja os principais sintomas de um animal com problemas odontológicos, quando ele é iniciado no adestramento básico.
• Balançar a cabeça
• Odor fético na boca
• Resistencia para os lados (esquerdo/direito)
• Apoio excessivo na embocadura
• Falta de apoio na embocadura
• Irritação e rabejamento
• Rebeldia e relutância
• Sobrepasso
• Claudicação
• Assimetrias
• Reações diversas contra os comandos de rédeas

O animal que apresenta qualquer desconforto na embocadura terá mais dificuldades para descontração, que é um dos exercícios primordiais e de extrema importância no adestramento básico. A falta de descontração aumenta a tensão do animal sobre a embocadura, podendo refletir diretamente na postura e no direcionamento do conjunto de frente, prejudicando assim sua atitude e comprometendo todas as demais etapas do adestramento básico.

A postura e o direcionamento do conjunto de frente estão diretamente ligados ao eixo de longitudinal dos equinos, ou seja, a sua coluna vertebral. Sendo assim, qualquer problema relacionado ao mau posicionamento do conjunto da frente pode ser resultante de dorsalgias e lombalgias, que poderão evoluir para um quadro de claudicação intensa.
O posicionamento do eixo longitudinal (coluna vertebral) dos equinos de marcha influencia diretamente na biomecânica e na dinâmica dos posteriores, sendo prejudicial na impulsão e na articulação dos membros.

Portanto, o animal que inicia sua carreira esportiva com problemas odontológicos com incômodo, reação à embocadura, mau posicionamento do conjunto de frente a coluna vertebral, negando o treinamento, pode perder parte da impulsão dos posteriores.
Animais que apresentam atitude de seu conjunto de frente denominada de “ponteira”, ou se apresentam com a atitude atrás da vertical, muitas vezes invertendo o pescoço, resultam no que chamamos de conjunto de frente “amassado”, causando limitação dos movimentos das espáduas, dos braços e antebraços. Esta atitude também interfere diretamente na respiração e captação de ar pelos equinos de marcha, que muitas vezes podem apresentar sinais clínicos de ronco na marcha e no galope.

Quando realizar a consulta odontológica?

Animais em regime a pasto ou em piquetes devem realizar a manutenção odontológica anual ou semestral. Animais em confinamento, que ingerem grande quantidade de ração, peletizados, fibras curtas (capim picado), e que são submetidos a treinamento intensivo, devem ser submetidos impreterivelmente semestralmente.

Antes de iniciar o adestramento básico, é de grande importância que esse animal já tenha realizado pelo menos um atendimento odontológico, assim quando lhe for apresentada a embocadura, esse animal possa ter melhor aceitação.

Os benefícios e resultados dos tratamentos odontológicos nos equinos de marcha fazem com que os animais agradeçam de muitas formas, se alimentando melhor e aproveitando mais os movimentos mastigatórios.

Com isso, triturando os alimentos em partículas menores, estamos diminuindo a incidência de cólicas e aumentando a absorção dos nutrientes.

No Adestramento Básico, a Odontologia Equina, quando associada a técnicas de equitação e adestramento de qualidade, realizada por profissionais conscientes e qualificados, que sabem não só domar, mas interagir com o animal, fazendo com que o processo de doma e adestramento se transforme numa troca de informações entre as partes, cavalo e cavaleiro com certeza terão grande sucesso nos resultados.

Por: Lucas Fernando Augusto (Médico-veterinário pela Universidade de Alfenas, atuante na área de Odontologia equina, Clínica Veterinária e Medicina esportiva de equídeos).