O conceito de estresse sofreu uma grande ampliação e, hoje, na Medicina humana pode-se falar de estresse em relação ao trabalho, nível de ruídos e urbanização. Em Medicina Veterinária fala-se do estresse do desmame, excesso alimentar, alterações dietéticas, superpopulação e transporte, criando-se um conceito de “meio-ambiente feliz” que se refere ao enriquecimento ambiental. Portanto, a situação de estresse é variável conforme a causa e o grau de manifestação no individuo. Por se tratar de um assunto vasto, serão destacados alguns aspectos considerados mais relevantes para esta primeira abordagem.
Os cavalos vivem em ambiente natural, em manadas (harém), contendo em média 20 indivíduos, podendo chegar a 40 animais com um garanhão, dependendo da maior disponibilidade de forragem e espaço. Seu comportamento regido pelas leis da natureza, desde a genética até as suas próprias regras e boa convivência. E todas estas têm consequências das quais não se foge. Se faltar alimento, buscam em outro local, do contrário, emagrecem, morrem, reduz-se o tamanho do rebanho, as atividades diminuem, a reprodução torna-se limitada, interferindo no crescimento do rebanho.
Ocorrendo acasalamentos indesejáveis, os genes que se manifestam podem resultar em animais fracos ou que não irão se reproduzir. A natureza cuida bem disso pela seleção natural. Entre os eqüinos existem regras próprias de relacionamento: há hierarquia entre os indivíduos com funções distintas para cada categoria de animais e de cada um em particular. É característico entre os cavalos, o fato das irmãs mais velhas ajudarem a mãe na educação e disciplina dos potros. Desta forma, o desmame poderá ocorrer após nove meses de vida ou até após o primeiro ano de vida, se a égua “ficar vazia”.
O desmame precoce e abrupto produz ulceração gástrica e intensa queda de imunidade, coincidindo com o início do inverno e a instalação de doenças respiratórias virais e bacterianas. É o período crítico na vida do potro e decisivo para o desenvolvimento do resto da sua vida produtiva. A movimentação do rebanho é livre e as diversas situações com as quais se deparam geram aprendizado ao longo da vida. Limitar a área do rebanho, separar animais em categorias, e impedir o contato entre eles pela separação dos indivíduos provoca várias consequências adversas, inclusive sobre a índole do cavalo.
Maior liberdade
As áreas das fazendas e haras estão cada vez menores afetando significativamente a forma de criação dos equídeos e impondo ajustes na quantidade de indivíduos ao local. Existem diversos sistemas de criação e propriedades que criam ou recriam animais. Também o perfil dos clientes e usuários são variáveis de acordo com a modalidade de utilização dada aos equídeos: corrida, pólo, salto, concursos de marcha, rédeas, tambor, laço, atrelagem, tração pesada e outros.
Independente do sistema e fase de vida dos equídeos, todos poderão enfrentar situações causadoras de estresse. Se chover pouco, por exemplo, a redução de pasto e alimentos pode gerar uma situação de estresse alimentar, semelhante ao ambiente natural. Isto contribui para menor rendimento de trabalho, menor índice reprodutivo, enfraquecimento dos animais e aparecimento das doenças comuns no rebanho.
Em uma fazenda organizada não haverá estresse por falta de alimentos, mas pode haver, sim, pelo seu fornecimento inadequado. Os cavalos livres na natureza permanecem cerca de 70% do seu tempo pastando, 20% em pé e apenas 10% deitados. Os cavalos que ficam em baias permanecem a maior parte do tempo em pé e 15% do tempo comendo. Isto influencia significativamente no comportamento e desempenho de nossos cavalos.
Permitir aos cavalos maior liberdade e maior tempo de trabalho é, então, uma questão essencial, alinhada com sua natureza. O trabalho deve ser realizado tomando-se os devidos cuidados em relação à adequação das selas e respeitando-se a capacidade de cada animal. O arreamento incorreto pode provocar feridas no corpo do animal conhecidas como “pisaduras”.
A qualidade da cama para os cavalos é fundamental, pois mantém o ambiente seco e confortável, permitindo seu descanso e saúde. A disponibilidade permanente, dia e noite, de feno, capim ou outro volumoso é fundamental para o cavalo. Concentrados ricos em carboidratos solúveis de rápida fermentação, quando fornecidos sem o volumoso em abundancia, podem provocar cólicas, laminites e o estresse, que por sua vez pode levar a uma úlcera gástrica. O concentrado deve ser fornecido várias vezes ao dia, com padrões de qualidade adequados e consistência firme, proporcionando maior tempo de mastigação. Os concentrados (rações comerciais) atuais possuem alta qualidade e atendem ás diversas exigências dos equídeos em todas as modalidades de utilização.
A adição de óleo nas dietas proporciona efeito positivo como fonte de energia e no desempenho dos equídeos, tendo também efeito calmante. Também os sais minerais são essenciais para equilibrar a dieta dos animais. O Magnésio possui efeito significativo sobre a redução do estresse, bem como o Cloreto de Sódio, que também atua sobre o comportamento deles.
Manejo Correto
Animais que mordem cercas, portas e outras coisas, escoiceiam as paredes, e que “engolem ar”, apresentam componentes genéticos para estas características, porque nem todos os animais submetidos às mesmas condições apresentam tal comportamento. Eles apresentam estes distúrbios de comportamento devido às condições inadequadas de manejo. Os equídeos necessitam de determinado teor de fibra na dieta e se este nível está baixo, com alimentação muito tenra, o hábito de morder acentua-se, mordendo cascas de árvores e cercas. Animais soltos ingerem alimentos mais fibrosos, misturados aos mais tenros e também folhas mais ásperas e fibrosas. Os animais que engolem ar apresentam o pH do estômago mais baixo e ficam mais predispostos à formação de úlcera gástrica.
O aspecto nutricional e a forma de fornecer os alimentos são muito importantes na prevenção dos distúrbios de comportamento dos eqüídeos. Mas temos uma diversidade de situações em que ocorrem falhas no manejo dos mesmos que causam alterações no comportamento.
Animal que permanece muito tempo fechado em baia, que trabalha pouco, ou sua área de piquete é pequena, também se estressa e manifesta de diferente formas sua insatisfação, passando a morder as cercas e baias, outras espécies animais e até a si mesmo, escoiceia e se torna pouco obediente aos comandos do cavaleiro.
Um cavalo que é levado a cobrir uma égua, e não tem o direito de cortejá-la, pode ficar agressivo durante o ato e pode não ejacular em algumas situações.
As pessoas que irão manejar os animais desde o seu nascimento além de estarem bem preparadas para a função devem ter um bom nível de compreensão sobre as atitudes do dia-a-dia dos cavalos.
Em suma, oferecer aos animais condições adequadas de alimentação, espaço suficiente para exercício e liberdade, criar condições de maior convívio e socialização entre os grupos de animais, e submetê-los a exercícios adequados e bem dimensionados, de acordo com sua idade e amadurecimento, são cuidados básicos que propiciam equilíbrio em todos os aspectos na lida diária com nossos animais e evitam o estresse em eqüídeos.
Fonte: Rivaldo Nunes da Costa – Médico veterinário, instrutor da ENA e consultor em Produção Animal
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